sábado, 1 de outubro de 2011

E quando chega o dia

E quando chega o dia em que você se vê frente a frente consigo mesmo. Não é mais uma daquelas tardes da infância, em que se encontrar com o espelho é uma festa e podemos admirar-nos pelo período que se fizer necessário, até a mãe chamar para tomar a sopa quentinha em frente à lareira e com a televisão toda ao seu dispor e cobertores coloridos cobrindo os seus pés.

“It’s real life, my son”, já responderia o pai ao menininho no banco de trás do carro após ter saído do dentista, ainda anestesiado.

E quando chega o dia em que você se vê frente a frente consigo mesmo e não tem tempo para pensar e não tem local aonde fugir, nem pai nem mãe nem anestesia para aliviar a dor no peito e afagar o coração pulsante? A decisão precisa ser tomada.
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Lendo um e-mail que recebi que falava sobre filhos e coragem, lembrei da minha festa de 15 anos. Como manda o protocolo, na noite da festa o pai da aniversariante tem que fazer um discurso para todos os convidados elogiando a sua filha. Não importa se o pai é tímido ou se a relação com a filha não é tão boa(o que não foi o meu caso, by the way); tem de ser feito.

Resultado disto, é um argumento que usei muito quando queria fazer alguma coisa e o meu pai tentava cortar as minhas asinhas. Naquela noite, mais de cinco anos atrás, o meu pai disse que eu era muito corajosa. Claro que fiquei orgulhosa, o meu pai me chamando de corajosa. Quem não ficaria?! Me lembrei de todas as árvores em que subi quando criança, das vezes que saía para passear segurando um cachorro maior que eu pela coleira, do piercing que fiz escondida na praia, da tatuagem que a minha mãe só soube depois de ver, da bebida que escondi dentro da armário. Uau, quanta coragem!

Mas passaram-se 5 anos desde a primeira vez que ouvi aquele discurso - tenho ele gravado e já assisti muitas vezes de novo, quando tinha que afastar o medo. E em 5 anos as dimensões das palavras e a dimensão de uma vida inteira mudam; tudo se desfaz e refaz tantas e tantas vezes.

Hoje, quando eu ouço a palavra coragem, sei que é muito mais do que a vontade de pular de um avião ou de não temer uma injeção ou uma tatuagem em local muito dolorido. Coragem é a capacidade de tomar decisões arriscadas, tendo a certeza de que, por mais difícil que seja no começo, o reconhecimento virá. É conseguir abrir mão de uma ou outra coisa hoje, para ter algo maior e concreto no futuro. É passar por cima de obstáculos, lidar com pessoas, fundir as próprias medalhas.

Eu não sei qual foi a intenção do meu pai, naquela noite. Será que ele a escolheu para a Amanda de 15 anos que se aventurava perigososamente ou para a Amanda de 20, de 30 e de 50 que tem toda uma vida para decidir?

Tomara que estivesse certo, meu pai.



P.S.: alguém sabe dizer se esse estivesse da última linha tá conjugado corretamente?

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